Após algumas horas de sono, soa o despertador. Uma da madrugada. Pego os víveres da geladeira e os passo para a bolsa térmica. Após um lanche rápido, apanho as mochilas e saio de casa, cheio de entusiasmo para mais um dia de montanha, sem me importar com a alteração de fuso horário biológico.
Noite fria. Lua cheia. O grupo das 11 pessoas se reúne no ponto de encontro e parte, precisamente, às duas horas.
Uma hora mais tarde, chegamos à fazenda (S 25° 13' 16,67" W 048° 51' 20,86"). Atendemos ao protocolo de preencher as lacunas de nome e destino, na lista dos montanhistas presentes nas trilhas. A distância a ser percorrida nem é tão grande (cerca de 8km) porém com muitos obstáculos, alguns perigosos que, não raro, fazem vítimas. Por isso o preenchimento garante um eventual resgate, se necessário.
É preciso coragem para embrenhar-se nas trevas da floresta. Horário de início da caminhada
3h25. A precursora da idéia e organizadora
do
grupo, Aliny Borba, jovem e destemida, membro ativo do Grupo Pegadas, vai na frente. Guia os aventureiros pela escuridão. Desmonta as teias de aranha do caminho.
As lanternas de cabeça acesas dão a sensação de estarmos em uma procissão. Nos vem a lembrança as expedições em cavernas, como as do Vale do Petar (SP).
O grupo caminha silencioso pela mata. Nos descampados desligamos as lanternas e caminhamos à luz do luar. Pausas para reagrupamento e breve descanso.
Primeira parada: fonte. Abastecemos os cantis.
Às 5h20 vemos pela primeira vez o contorno das montanhas mais escuras em relação ao céu (foto Pico do Itapiroca). Vemos a imponência do maciço granítico do Paraná a poucos km de distância à frente.
Um dos objetivos é chegarmos ao A1 (primeiro acampamento - S 25° 14' 48,30" W 048° 49' 26,40") antes do alvorecer. O GPS informa que o sol romperá a linha do horizonte às 6h58. O grupo, bem preparado fisicamente, mantém um bom ritmo e chega a quinze minutos da aurora.
A temperatura é ainda mais baixa do que na fazenda. A roupa molhada de suor aumenta a sensação térmica de frio. Estamos na altitude de 1575m. Após um breve lanche, testemunhamos a um esplêndido nascer de sol, no longínquo horizonte.
Desligadas as lanternas, seguimos então para o A2. A trilha vai se tornando mais pesada, não só pelo aumento das dificuldades em se transpor os obstáculos rochosos, mas também por já estarmos há mais de 4 horas caminhando, com ar mais rarefeito e sem uma boa noite de sono. A luva de trilha se revela fundamental. Utiliza-se a força dos braços com bastante freqüência e as superfícies rugosas castigariam muito mãos sem luvas.
Seguimos corcoveando pela crista das montanhas (foto), num cansativo sobe e desce.
Chegamos a descer um desnível de mais de 100m para então iniciarmos o derradeiro ataque ao cume. O caminho passa então a contornar o maciço do Paraná pela direita, face oeste, à sombra nesta hora do dia. Momentos típicos de escalada a partir de agora. Abraçando-se a pedras e utilizando como apoio grampos estrategicamente colocados ou correntes, vamos subindo. Com algumas pausas para diminuir os batimentos cardíacos, acelerados não se sabe se pelo esforço ou pelo medo provocado pela proximidade dos precipícios. Chegamos ao A2. Última parada para descanso. Alguns companheiros partem na frente. Aproveito para observar a paisagem. Nenhuma formação nebulosa no céu. Atmosfera límpida. O visual é hipnotizante.
Exaurido de forças já posso observar pessoas no cume (foto abaixo). Não consigo identificá-las dessa posição. O objetivo está bem próximo agora. Última pausa para descanso e 5 horas e 40 minutos depois do início da caminhada atingimos o ponto culminante do estado com 1879m de altitude (S 25° 15' 10,30" W 048° 48' 31,60"), segundo o GPS.
Inspirado pelo livro As Montanhas do Marumbi e com a ocasião proporcionada pelo Grupo Pegadas, retornei ao PP, após 18 anos. Parece que foi ontem. Nada na montanha mudou. Dei mais sorte desta vez pois o tempo colaborou para boas fotos. Melhor equipado, mais experiente e mais bem preparado , consegui cumprir a jornada de ida e volta no mesmo dia, sem a necessidade de acampar como fizemos em 90. Foram pouco mais de 10h de caminhada. O monitor cardíaco registrou o consumo de mais de 8000kcal (embora alguns companheiros achem que este valor não esteja correto).
Para nossa surpresa (e para diminuir a grandeza de nossa façanha), encontramos um praticante de parapente, devidamente equipado e prestes a decolar do cimo. Após três ou quatro decolagens abortadas, eis que piloto partiu! Dêem uma olhadinha no vídeo abaixo.
Obrigado pela sua companhia em mais essa aventura.
Abraço peregrino a todos _o/